quarta-feira, 9 de julho de 2014

Momentos e Reflexões


Depois de receber queridas visitas, trocar carinhos com uma gripe, levar um tombo de bicicleta e ver nossa Seleção Canarinho ser humilhada, aqui estou novamente organizando idéias e brincando com as palavras...
Três diferentes situações, destes últimos dias,  martelaram minha cabeça.

Primeiro momento.
Sentada em uma grande mesa retangular, em uma fria cozinha conjugada com uma copa, estávamos atentos em  nossa última aula semestral. Cada qual mais compenetrado que outro, uma vez, que tínhamos uma árdua missão: falar sobre o nosso país ou cidade, para os colegas, mas em holandês!
Nos foi sugerido levar fotos. Sem fotos; como quase todos que aqui chegam, imprimi dois mapas do Brasil: um localizando-o na América Latina e outro com suas divisões regionais.
Meio claudicante com as frases, consegui repassar algumas informações e atiçar a curiosidade dos colegas. O colega seguinte, também nos trouxe um mapa.
Nascido no Leste Europeu, passou por várias situações de conflitos civis, onde seu país deixou de existir e outros surgiram. Nem depois disto os problemas terminaram. Estes, acabaram obrigando-o a abandonar suas raízes.
O outro mapa não mostrava história diferente...
E mais outro, que  foi apenas rabiscado ali, na hora, para  mostrar um pouco dos horrores da guerra, motivada pela ganancia e diferenças religiosas.
A próxima colega nada tinha, a não ser o alívio de ser uma sobrevivente de uma ditadura cruel e assassina, que afugenta sua gente para outras terras.
E mais uma, que mostrou uma linda foto de Buda e palácios...
Viera em busca de um amor, fugindo da miséria que assola sua terra ...
Estas estórias ficaram pululando em minha cabeça...
Eu era a única, naquela mesa, que podia escolher voltar e permanecer no meu país.
Um país com muitas mazelas, com certeza,  mas livre! E ainda com condições razoáveis de vida!
Posso escolher ficar ou voltar a qualquer hora ...
Descobri uma grande riqueza: o poder da escolha! E, de quebra, a valorizar mais o meu cantinho brasileiro...

Segundo momento.
Um post satirizando as pessoas que cometem faltas ao escrever em outras línguas me chamou a atenção. A crítica me afetou. Estou naquele período de aprendizagem em que você deseja se comunicar, mesmo sabendo que ainda comete erros grosseiros.... Mas o desejo da comunicação é maior... 
E, se temos ferramentas para nos ajudar, me refiro ao " Google Translator" ou qualquer outra,  por que não usá- las?
A piada ia além, criticando aqueles que não escrevem corretamente a própria língua; no caso, o Português!
Cagliari, que tem pós doutorado em Língüística pela Universidade de Oxford, no seu livro Alfabetização e Lingüística, 1999, faz a seguinte colocação (lembrando que estamos falando sobre Sociolingüística): Certo e errado são conceitos pouco honestos que a sociedade usa para marcar os indivíduos e classes sociais pelos modos de falar e para revelar em que consideração os tem... Essa atitude da sociedade revela seus preconceitos, pois marca as diferenças lingüísticas com marcas de prestígio ou estigma.
Marcos Bagno, doutor em Filologia, afirma que " Ninguém comete erros ao falar sua própria língua materna, assim como ninguém comete erros ao andar ou respirar."
Sendo assim, vamos encontrar pessoas que caminham e respiram como verdadeiros atletas, outros que o fazem com elegância e ainda, outros que caminham e respiram com certa dificuldade...
Podemos criticar as pernas ou os pulmões falhos?!
Eu tenho absoluta convicção que venho cometendo faltas com o nosso vernáculo.
Após a última mudança ortográfica, já não encontrava motivação para rever todas estas pequenas regras gramaticais. Me acomodei. Acho que, com a idade, minha respiração está um pouco mais lenta.... (Risos).
Fica, aqui, registrado a minha solidariedade aos que aos " trancos e barrancos", assim como eu, estão lutando para se comunicarem em outra língua. E vamos usar, sim, todas as ferramentas que possam nos alavancar nesta Torre de Babel.

Terceiro momento.
E de novo a bicicleta... Mas morando por aqui, não há como esquecê- las...
Não menos importante que aprender o holandês, venho treinando para " bicicletar" na minha bike de mocinha. Uma de segunda mão!
Lembro que cerca de uns seis anos atrás, quando ainda nem imaginava me fixar por estas bandas, externei meu desejo de, antes de morrer, aprender a pedalar. Sentada naquela mesa grande da cozinha da dona Negrinha, o senhor Lió, esposo desta, com aquele jeito mineiro de ser e com toda a calma, olhou para mim e disse: Pois, olha menina, é só querer e sair por aí treinando... Vai levar uns tombo, mas levanta e sobe de novo que logo, logo se aprende... Eu aprendi tava com sessenta ano, ô cê que é mais nova num vai aprendê?!...
O senhor Lió, hoje, com quase noventa anos, está mais do que nunca em meus pensamentos. Por muito tempo, ele pedalou pelas ruas de Santa Juliana e por estradas vizinhas...
A semana retrasada  levei meu primeiro tombo, nada sério, mas a cicatriz no joelho será a evidência de que não desisti. A minha recompensa foi, na semana seguinte, pedalar por mais de uma hora, sentindo a brisa fresca do verão holandês me envolver, me sentindo abraçada pela alegria deste momento.
Cair e levantar fazem parte das conquistas. Arranhões ou cicatrizes tornam-se troféus que eternizam estes momentos.Sendo assim, vou seguindo.

Agradeço o post da crítica, que me permitiu relembrar meus tempos de educadora, enquanto lia O Conceito de Erro em Sociolingüística de José Pereira da Silva, de onde copiei trechos, aqui usados.
Recomendo. Simples e fácil de ler. E, ainda, à família do Sr. Lió que, gentilmente, enviou e permitiu o uso da foto.










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